a falta que o foco faz

às vezes, eu tenho medo de mim.
às vezes, eu me decepciono comigo.
às vezes, não quero nem pensar em que eu sou.

mas quando faço isso, fico perturbada. tenho medo daquela menina ter ido embora. aquela menina, entusiasmada, brava, carregada de sentimentos e emoções. tenho medo de ter virado uma coisa racional.

e eu não sou assim.

mas ser racional me deu equilíbrio. me fez não cair tanto, espatifar no chão. não ter que pedir tantas desculpas. mas a vida era mais emocionante quando eu fazia esse tipo de coisa.

ontem, conversando com ele, ouvi dizer: "nós dois somos dois grandes improdutivos. a diferença é que eu já me dei conta, diagnostiquei, você, não."

eu não tenho foco. e ficou claro no mini currículo que fiz. não tenho metas de vida. nunca fiz questão de ter. mas chega uma hora que isso... pesa. e aí vem o meu racional brigar com o meu tô-nem-aí. ainda sinto que, às vezes, ele é mais forte, essa sensação de foda-se, eu faço o que quero.

mas eu fico aqui, mandando o mundo ir pro espaço, enquanto não saio do lugar.

e esse é o meu medo.

preciso achar uma coisa. preciso me agarrar a alguma coisa que ache que, pelo resto da vida, possa fazer. e eu simplesmente não sei o que é. não sei. gosto de um tanto de coisas, mas não sou boa em nenhuma delas.

esse era o tipo de crise que a gente tinha que ter só na adolescência, não?
(ou muita gente esconde isso depois de adulto?)

eu não sou jornalista. não sou blogueira que os outros queiram ler. não sou uma desenhista que tenha idéias. não sou uma artista que tenha vontade de fazer obras. não sou uma escritora cheia de idéias. não sou... nada. e sou um pouco de tudo.

mas talvez o foco seja ser apenas uma ou duas coisas. e ser bem. ser boa.

perder o foco me faz ser nada.
esse é o grande problema.

Diálogo

- Oi Alessandra, tudo bem?

- Tudo. Quem é você?

- Ah, você me conhece muito bem. Estamos sempre conversando. Até brigar, já brigamos. Já falei muito com você. Você até que me ouve. Mas sabe aquela coisa de que santo de casa não faz milagre?

- Hum...

- Pois é. Mais ou menos assim é a nossa relação. Eu sou o santo da sua casa, praticamente seu anjinho da guarda. Mas ainda não consegui operar milagres...

- O que você quer dizer com isso?

- Posso te fazer uma pergunta?

- Claro.

- Você está feliz com a sua vida?

- Como assim?

- Você está satisfeita com o que você está fazendo com a sua vida?

- Você está entrando num terreno delicado.

- Eu sei.

- Sim e não.

- Sim e não?

- É. Sim e não.

- Por que sim?

- Sim porque, graças a Deus, estou bem de saúde. Não diria 100%. Mas por minha total culpa. Vamos colocar uns 92%. Percentual que me dá condição de fazer tudo que quero. Sou muito feliz por ter condição física de fazer as coisas que quero.

Sim porque tenho uma casa linda no lugar que eu queria. Talvez não na cidade que eu queria, mas, já que estou aqui, é o melhor lugar que eu poderia estar morando. A casa é linda, decorada com todo o meu bom gosto, tem uma vista linda, passarinhos, piscina, tudo de bom.

Sim porque estou numa fase ótima do meu casamento. Porque meu marido é companheiro, temos muitas afinidades, me apoia em tudo que eu quero fazer, acredita no meu potencial.

Sim porque meus pais estão vivos e bem. Porque são especiais e sempre buscam me dar o melhor. Porque meu sobrinho é um querido e será um grande homem. Sim porque, mesmo com os problemas, minha relação familiar é sadia. Acredito que muitos dos meus traumas e inseguranças são culpa da minha mãe, mas ela sempre quis o meu bem. Só não sabe lidar com as inseguranças dela e as joga em mim.

Sim porque tive ótimas oportunidades na vida e porque tenho um emprego hoje. Não é meu ideal, mas me ajuda a fazer um monte de coisas que gosto.

Sim porque eu acho que tenho uma forma de ver o mundo diferenciada. Sei apreciar o que é belo, sei apreciar o que é bonito nas relações. Eu vejo coisas que as pessoas comuns não veem. Eu tenho interesse por coisas que os normais não têm. E eu gosto disso. Só não gosto de não ter muito com quem compartilhar essa visão.

Sim porque eu viajo bastante. Conheço lugares lindos. Tive uma experiência maravilhosa quando morei fora. Sou uma abençoada em vários sentidos.

- E o não? Onde está?

- Não porque sou demasiado insegura para correr atrás dos meus sonhos. Porque eu estudei e me preparei para atuar na área que eu amo e não consigo ir atrás disso.

Não porque, apesar do preparo, estou muito aquém do que eu gostaria estar. Porque ainda não tenho o conhecimento que eu gostaria. Porque me sinto uma farsa. Porque sou orientada por minha preguiça e meus complexos. Porque permito que as frustrações da minha família me impeçam de seguir adiante. Permito também que os maus julgamentos de pessoas perto de mim se comprovem por falta de eficiência minha.

Não porque acho que ganho pouco. E me sinto aprisionada, como se não pudesse seguir adiante. Porque tem alguma coisa dentro de mim que me força a ser uma pessoa ordinária. Mas eu sei que eu não sou. Sou diferente e, desculpe a franqueza, sou melhor que muita gente por aí. Mas não sou tão corajosa quanto essas pessoas. E elas estão melhores na vida que eu.

Não porque não sou uma realizadora de sonhos. Porque permito que os outros tomem as rédeas da minha vida.

Não porque eu quero me destacar e não consigo. E o pior é que eu sei que a culpa é só minha. Deus deve estar muito puto comigo por ter me dado tanto talento que eu estou desperdiçando...

- Mas não é possível. Eu te aviso todos os dias que você está desperdiçando seus talentos. Eu causo inquietudes em você. Dores. Raiva. Eu sou a voz, dentro de você, que te fala para seguir adiante. Sou eu, Alessandra, eu. Todos os dias, te acordo com uma angústia no peito pra ver se você age. Sou eu que te dou ideias extraordinárias. Por que você não me ouve? Eu sou o santo da sua casa que não opera milagres. Você não me deixa fazer isso com você.

- Mas quem é você?

- Você ainda tem dúvidas? Eu sou você, sem máscaras. Ou melhor, com as máscaras que VOCÊ escolheu atuar. Você tem as máscaras dos outros. Eu tenho as suas. Aquelas que têm a sua medida e que vão te fazer ficar linda na foto.

- E por que não consigo vestir essas máscaras, já que são minhas?

- Isso, VOCÊ e só você precisa descobrir. Eu estou aqui, do seu lado, dentro de você, do seu mais profundo desejo e sonho. Estou só esperando que me deixe atuar...

amigos, amigos... amigos a parte

eu escrevo aqui coisas que eu só queria contar para você. mesmo que você nem veja.

acabei de voltar de férias, 15 dias longe e em outro país. foi tudo muito bom. claro, coisinhas me irritaram. principalmente, as que descobri e que sempre estiveram ali.

nem vou perder tempo explicando muito bem isso. são coisas bobas, como aquela pelinha da unha que você puxa e incomoda um pouco, mas nem por isso vai fazer você ficar lembrando disso o tempo todo.

mas me incomoda o fato de ter me incomodado. eu queria ser mais como vinícius de moraes. amigo de todas as horas, casa aberta sempre, apreciando o lado bom das coisas. a bebida, dizia ele, que ajudava a "poder tudo" (é, amigo, eu também sinto isso). e dizia ainda que só gostava do mundo depois da segunda dose.

mas a gente não muda assim, da noite pro dia, quem é, não é?

e eu era muito assim quando vivia em goiânia. sinto falta desse lado. nem tanto da química no sangue em si - sim, essa às vezes faz falta - mas desse lado de ter tantos amigos e tanta gente divertida e interessante do lado. e não acho que isso seja coisa de uma certa fase ou idade. tem gente que morre assim, rodeado de muitos bons e velhos e companheiros amigos.

mas na falta das pessoas, acho que é bom procurar outros velhos amigos - artes, música, filmes e bons livros. e, claro, vez ou outra aquele melhor amigo do vinícius... um cachorro engarrafado.

sobre a simplicidade

cheguei de viagem hoje.

e não vou falar aqui da viagem. mas de uma ligação. cheguei e liguei para a minha mãe. mas ela está viajando, fazendo um treinamento do trabalho dela. ainda assim, sentia a necessidade de ligar para alguém da minha família e dizer "alô, estou viva!"

liguei para os meus avós maternos. eles sempre gostam de saber quando a gente chega, seja em que lugar for. meu avô perguntou se aprendi russo, falei que só sabia falar obrigado e ele já achou bom. passou o telefone para a minha avó, que, num rápido interrogatório, quis saber se estava tudo bem, como tinha sido a viagem e como estava o meu namorado.

depois, começou a me contar a história de que havia plantado no quintal uma árvore que dá uma fruta chamada noni. falou durante uns 10 minutos sobre a fruta, os benefícios para o organismo, contou que tinha contratado um homem para plantá-la e que daqui 6 meses já dá para comer a fruta. estava tão empolgada com a árvore, que fez a minha viagem de 12 dias para a europa parecer fichinha perto da história dela.

eu amo esse tipo de simplicidade.

dessas que fazem as coisas serem boas, mesmo quando pequenas. serem um espetáculo a ser admirado, mesmo que leve 6 meses para isso. coisas simples, que acontecem em volta da gente e que meus avós ainda percebem, mesmo depois de anos as vendo repetir. mesmo que seja uma árvore.

eu gosto desse tipo de simplicidade... e queria ter ela comigo sempre.

Um lugar para a tristeza

sábado, 8 de maio de 2010 17:48 Postado por Carina Dourado 0 comentários
O fato você já sabe: o Fernando se matou.

E eu fiquei lembrando com ironia daquela música do Legião "ela se jogou da janela do quinto andar, nada fácil de entender".

Em Goiânia, era fato: eu tinha mais amigos com depressão. Gente que às vezes ficava dias sem sair de casa porque estava mal. Respeitavam a dor. Mas nunca vi ninguém se suicidar.

Aqui, não vejo ninguém falar que tem depressão. Na verdade, você assumir que está triste é quase um atestado de óbito. Geralmente (e quando digo isso, é porque já me preocupei),  a minha tristeza não me incomoda. Sei respeitar minhas fases - alegria, tristeza, desânimo. Não forço. A vida é assim, de fases.

Mas aqui, estar alegre é lei. Você sai e só vê gente que se diz feliz. Isso me perturba um pouco. Não por não gostar da felicidade alheia. Mas porque às vezes soa forçado. E na maioria das vezes a gente acredita.

E se não falam, restam os sinais. E eles parecem ser tão difíceis de se notar! Difícil imaginar os problemas, aflições, mágoas, sofrimentos.

Me lembro quando você voltou da Espanha e estava sofrendo. Teve seus momentos de reclusão. De solidão. De não querer falar nada com ninguém. E eu respeitei. Apesar de que muita gente não.

Porque aqui é inconcebível estar triste.
Mas é lei ser feliz.

E isso, nem sempre, é bom.

Imaginar o corpo dele estirado no chão me faz ter certeza disso.

Lugar certo ou atitude certa?

O que você escreveu me fez olhar para tudo a minha volta e me sentir como se não estivesse no lugar certo.

Mas preciso parar de pensar assim. Estou no lugar que deveria estar porque essa é só uma vida e pronto. Eu posso sair daqui a hora que quiser e só não saio porque tenho um emprego que me paga bem. Tenho um apartamento que gosto. Tenho conforto. E um menino lindo do meu lado que conseguiu arrumar um emprego aqui para ficar comigo.

Se eu quiser (e se ele topar), a gente joga tudo isso para cima e vai embora.

Engraçado é que eu tenho a sensação de que ainda vou morar fora daqui, num lugar que dê para fazer tudo o que você fez e sente falta. Mas não agora. Talvez, mês que vem, quem sabe?

(engraçado também porque quando morei em Goiânia, tinha a mesma sensação, de que ia voltar pra cá)

Mas neste exato segundo, eu estou aqui. De frente para uma janela que me dá uma amplitude tão grande. Sentada depois de fazer almoço do jeito que eu tenho que comer, com muita coisa natural, tomando uma xícara enorme de chá e vendo o céu tão lindo.

Se eu não posso estar ali, onde queria, tenho que me agarrar, por enquanto, nas coisas boas. Sabe o que acho estranho? Voltei a gostar de Brasília. De coisas pequenas, mas estou fazendo as pazes com a cidade - o que a torna menos cruel de se morar.

Ainda bem que moro aqui nessa fase. Achei um médico que está me investigando por completa. Tem lojas que vendem coisas que achei que não poderia comer mais por restrições alimentares. Tenho academia no meu prédio (mesmo que eu nunca tenha descido pra lá pra fazer exercício). O salário que eu ganho, aguentando o que eu aguento todos os dias - gente gritando, desrespeito, fofoquinhas e blablablás - consigo fazer o que gosto. E ainda sobra dinheiro!

Então é isso.
Eu me estipulei isso (apesar de não ser nada disciplinada): vou tentar achar coisas boas por aqui. Porque preciso, questão de sobrevivência.

Mas, claro, sem deixar de sonhar com um lugar onde as pessoas dão livro umas para as outras em datas especiais. Ou façam flashmobs no metrô.

Eu sei que tem lugar melhor para ir... e um dia, eu vou.

Hoje, eu não queria estar aqui…

sexta-feira, 23 de abril de 2010 11:59 Postado por Alessandra Peruzzo 0 comentários

Hoje, eu queria estar em outro lugar. Em um lugar onde visse muita gente andando nas ruas, carregando sacolas cheias de livros e flores. Hoje, eu queria ver um mar de gente andando pra lá e pra cá. Queria sentir o sol no meu rosto e olhar pra cima e pros lados, enquanto caminhava, apreciando prédios, postes, árvores, ruas… personagens.

Hoje, eu queria não ter que ir para minha casa de carro. Aliás, eu não queria ir para a minha casa. Queria caminhar, caminhar, caminhar. Depois de muito tempo caminhando e observando as pessoas, eu queria sentar numa mesa de bar, um desses barzinhos de esquina, bem fulerinha e familiar. Eu queria tomar cerveja e comer papas bravas e ao alho e óleo (eram as melhores)! Fumar um porro com minhas amigas (apesar de nem gostar muito disso) e conversar e conversar! Depois, se desse, gostaria de caminhar no parque e sentar no gramado. A conversa continuaria.

Mais tarde, quem sabe, dançar um pouquinho. Desengonçada, completamente desajustada. Mas feliz! Sorrindo, o que é mais importante.

No fim dia, queria ir à casa da minha outra amiga. Lá beber um licor, conversar amenidades e fumar a chicha com chucherías. E voltar para casa só depois da meia-noite, caminhando… e apreciando prédios, postes, árvores…

Hoje, eu queria ser o personagem principal da minha própria vida. E seguir o roteiro – aquele de fantasias - que eu escolhi pra mim.